A Volvo do Brasil (Parte 1) – Negociações e Chegada

A Volvo construiu uma história fantástica e gloriosa desde o seu início. A fabricante sueca de automóveis, ônibus e caminhões decidiu investir no Brasil em meados dos anos 1970.

Esse assunto me atrai pois pelo meu trabalho, posso acompanhar um tanto quanto de perto como a Volvo pensa, age e projeta o futuro. Tive a honrosa oportunidade de visitar sua fábrica em Curitiba – PR e fiquei eufórico com o que vi. Realmente é de aplaudir como são organizados, educados e focados em seu objetivo.

Estive na fábrica no final de 2019, quando se comemorou os 40 anos da Volvo no Brasil. As passarelas estavam cheias de cartazes contando um pouco sobre essa história de sucesso. Havia também o primeiro caminhão Volvo produzido no Brasil e mais outros caminhões icônicos por lá. Fui apresentado também à pedra fundamental da fábrica, um marco histórico.

A cada passo lá dentro, eu ficava ainda mais maravilhado com tudo o que via e o interesse de saber mais sobre tudo aquilo tomou conta de mim. Foi assim que nasceu essa pesquisa e espero que ela possa, quem sabe, trazer algum material “novo”.

Pesquisei o período de 1975 à 1983, resultando em 360 recortes de jornais e revistas. Dividirei em algumas partes, mas vale a pena o esforço.

 


Vamos começar então pois tem muita coisa pra gente ver:


Diário do Paraná 18.12.1975

Com a missão recebida pelo Presidente do Brasil Ernesto Geisel, de salvar Curitiba, o seu prefeito, Saul Raiz, apresentou diversos programas em reunião com o presidente. Entre eles estava a proposta da instalação da Volvo na Cidade Industrial de Curitiba (CIC), pois assim, mais 10 ou 12 empresas se instalariam ao seu redor consolidando de vez a CIC, trazendo inúmeros benefícios para o município.

A Volvo se comprometeu a exportar 25% de sua produção e o acordo foi aprovado por Geisel. O BADEP, Banco de Desenvolvimento do Paraná participaria do capital da empresa com 200 milhões de cruzeiros de forma que a maioria das ações com direito a voto pertenceriam ao Banco.

O prefeito Saul Raiz deu como certa a instalação da Volvo no Paraná e a intenção do embaixador da Suécia é começar a instalação em janeiro de 1976. A Volvo só poderia fabricar caminhões pesados.

A vinda da Volvo para o Brasil estava diretamente ligada ao desenvolvimento de Curitiba. A consolidação da CIC tornaria aquela região num polo muito rico.




Diário do Paraná 22.2.1976

Virou notícia no Brasil o que acontecia com a Volvo ao redor do mundo. Aqui, ainda estavam em curso estudos para que se concretizasse a instalação da fábrica.

 

Diário do Paraná 28.10.1976

Jayme Canet Junior, governador de Curitiba em conversa com o presidente Geisel, recebeu a notícia no dia 27/10/76 que a instalação da Volvo na CIC estava aprovada.

A nova fábrica vai criar 1.000 empregos diretos somente na empresa, além do surgimento de diversas outras industrias complementares, ampliando a oferta de vagas.

Canet ainda disse que a chegada da Volvo marca um ponto sem retorno na transição da economia basicamente agrícola e agroindustrial do Paraná para o estágio industrial avançado. Os paranaenses verificam que estão transpondo a fronteira entre dois tempos.

Essa notícia foi muito bem recebida por outras empresas que querem investir no Brasil. O Paraná estava investindo forte em atrair ainda mais empresas para diversificar as operações do parque industrial.

Para Luiz Antonio Fayet, presidente do BADEP, a decisão sobre o projeto Volvo “foi resultado de um exaustivo processo de discussão e de análise sobre as vantagens que poderia representar para o desenvolvimento do país e também para o Paraná. ”

Continuando a leitura, podemos ver que a partir de agora, praticamente todo o crescimento da CIC se daria automaticamente pois tudo estava ligado: empregos, impostos, novas fábricas, mão de obra especializada... Tudo graças a chegada da Volvo.

O investimento da Volvo será de 892 milhões de cruzeiros para se instalar no Brasil. A Volvo do Brasil S.A. será a primeira montadora de veículos com controle acionário brasileiro. 60% das ações serão de brasileiros e os 40% restantes, da Volvo da Suécia.

O programa de produção estava traçado e a previsão do seu início é para 1978.

O grande trunfo da Volvo é o seu caminhão pesado N10, que tem capacidade de carga superior e substitui várias viagens de caminhões menores.

A previsão é excelente!



Diário do Paraná 19.2.1977

Os diretores da Volvo estão analisando não apenas utilizar o Porto de Paranaguá para exportar o excedente da produção, mas também utilizá-lo para importar equipamentos para a montagem dos veículos em Curitiba.

Há informações de que a construção da fábrica pode ter início no próximo mês e que também há possibilidade da fabricação de chassis para ônibus, aproveitando as medidas de racionalização tomadas pelo governo brasileiro. Essa segunda informação não agrada nem um pouco as multinacionais concorrentes da Volvo.

Bom, veremos o que se concretiza...



Diário do Paraná 2.4.1977

As negociações para linha de crédito continuam. Era um período de dificuldades financeiras, pois o mundo passava pela segunda fase da crise do petróleo que já vinha causando problemas desde 1973.


Diário do Paraná 3.4.1977

Uma comitiva virá da Suécia para o lançamento da pedra fundamental da fábrica. Isso pode acontecer já no dia 15. Porém, não se sabe ainda qual é o terreno escolhido.

Já faz quase 1 ano e meio que prometeram que a fábrica seria construída, mas até agora não aconteceu. Isso acabou gerando boatos que a Volvo poderia se estabelecer em outro estado.


Paciência pessoal... Estamos vendo que não é nada simples trazer uma empresa de forma responsável e correta. 


Diário do Paraná 7.4.1977

Agora temos algo concreto.

Que honra heim... Muito especial que o príncipe Bertil da Suécia venha participar desse evento.

Vamos acompanhar mais notícias, mas já dá para entender que a própria Suécia aprovava e fazia gosto da chegada de uma de suas grandes empresas ao Brasil.

E assim acabam as especulações de que Curitiba não seria mais a escolhida....


Diário do Paraná 17.4.1977

Confirmação do lançamento no dia 27/04


Jornal do Brasil 17.4.1977

Hummm o vice-presidente da Mercedes-Benz do Brasil acha que é um problema para a indústria automobilística que a Volvo se instale no Brasil... outros empresários do setor automotivos já mantiveram contatos com as autoridades do Governo Federal para expor essas dificuldades....

Está bem claro aí que o interesse é não perder a zona de conforto. Quanto mais concorrência, mais os produtos são desenvolvidos, resultando em crescimento, vendas, lucro... Essa forma aí de pensar está bem fora do que uma empresa gigantesca como a MB deveria ter.


Diário do Paraná 21.4.1977

Aí está o programa para o grande lançamento da pedra fundamental da Volvo no Brasil.



Jornal do Brasil 24.4.1977

Chegou!

Suécia e Brasil vêm aumentando suas relações comerciais e com a Volvo, darão mais um grande passo nesse intercâmbio.

Vejam que bonito, o Príncipe Bertil se casará em dezembro com a Princesa Lilian com a qual está junto há 33 anos.

Nessa época ele tinha 65 anos.


Diário da Tarde 25.4.1977

Se a viagem no tempo fosse possível, seria nesses eventos que eu iria.

Jornal do Brasil 26.4.1977

O diretor do grupo Volvo conversou com o Ministro interino da Fazenda sobre mais estímulos para a implantação da fábrica. Recebeu uma resposta firme e negativa, mas o processo já está em andamento e isso não vai atrapalhar em nada.

Essa reunião aconteceu já com a chegada do Príncipe Bertil que com mais 16 empresários suecos trataram de diversos negócios com o governo em Brasília.

Nessa ocasião, o Ministro das Relações Exteriores condecorou com a Ordem do Cruzeiro do Sul, o industrial e diretor da Volvo do Brasil Limitada, senhor Seven Borje Rehnby; a Princesa Ragnhild e seu marido, o industrial Erling Lorentzen (morando no Brasil há muitos anos) que agradeceu em nome dos homenageados.

Essa condecoração é destinada a personalidades estrangeiras.

Bom, se não foi possível conseguir mais incentivos, pelo menos a relação entre eles estava bem calorosa e respeitosa.

Diário da Tarde 27.4.1977

Chegou o dia tão esperado! O lançamento da pedra fundamental da fábrica da Volvo em Curitiba com a ilustre presença do Príncipe Bertil, da Suécia.


Diário do Paraná 27.4.1977

Programação definida e tudo pronto para a grande solenidade.

O fato dos acionistas brasileiros terem 60% das ações ordinárias é um ponto muito positivo para aumentar o interesse dos empresários, da cidade e estado também.

O índice de nacionalização dos caminhões será de 71% no início, devendo atingir 92% em 1981.

Dos 1,5 milhão de metros quadrados do terreno da Volvo, apenas 42 mil metros serão construídos agora. Haverá muitos empregos diretos e indiretos.

O jornal traz também um pouco da história da Suécia




Diário do Paraná 27.4.1977

O Presidente da Comissão de Indústria e Comércio da Assembleia, Luis Alberto de Oliveira, definiu o dia 27 de abril como o de uma nova era que se abre para a economia estadual, com o início da implantação da fábrica da Volvo na Cidade Industrial de Curitiba.

 

Realmente um marco!


Diário do Paraná 28.4.1977


Temos imagens!

Após uma longa negociação, finalmente estava consumado: a Volvo começaria a ser construída no Brasil. A previsão de término é para 1979.

Esse acontecimento importantíssimo contava com o apoio de empresários, do povo, do prefeito, governador, presidente do Brasil, Príncipe da Suécia... Agora é só o pessoal da Volvo chegar e fazer o que sabe de melhor.

Tage Karlsson, presidente da Volvo do Brasil ainda disse que os motores dos caminhões ali fabricados, poderão depois de uma adaptação, utilizar até 90% de álcool como combustível.

Muito interessante...

A foto também é muito boa, podemos ver ali a mesma placa que existe até hoje lá na fábrica da Volvo.

Diário do Paraná 28.4.1977

Ah o idioma... devia ser até mesmo engraçado a forma de se comunicarem. Pelo que dá pra entender, falavam sempre em inglês, mas sem dúvida um tentava aprender o idioma do outro, o que é mais do que natural.

A presença do Príncipe causou impacto, não é sempre que possível ver de perto um membro da realeza.

E olha, vou sugerir ao pessoal da Volvo que recebam a todos com a mesma frase utilizada pelo Príncipe Bertil: “É com imenso prazer que lhes dou boas-vindas ao local de lançamento do marco inicial da Volvo em Curitiba”. Seria legal.

No discurso foi lembrado o bom relacionamento da Suécia com o Brasil e mostrado também como a Volvo vai poder contribuir para o desenvolvimento dos transportes no país tanto com caminhões, como com ônibus. Nessa época ele já falava de solução de transporte que preservasse o meio ambiente.

Podemos notar aqui que a Volvo estava vindo para o Brasil, mas talvez um fator importantíssimo que isso agregava é trazer também a cultura Sueca. Sem dúvida, aquela região nunca mais seria a mesma.

Mais uma curiosidade sobre o Príncipe. Ele foi comandante de esquadras suecas em patrulhas durante a Segunda Guerra Mundial, tendo os postos de Almirante na Marinha, General de Exército e Tenente Brigadeiro da Força Aérea.

É pouco ou quer mais? Gostei do Bertil.

Diário do Paraná 28.4.1977

Ah olha só que legal, a Volvo foi fundada na Suécia no dia 14 de abril de 1927 há quase exatos 50 anos.  É com essa carga de experiência e história que ela chega ao Brasil.


Diário do Paraná 28.4.1977

Que foto!

Talvez eu não consiga passar a emoção exata que senti quando encontrei esse jornal, mas foi muito forte, pois na visita à fábrica, eu já tinha ido à loucura por ver a placa fixada e depois quando encontrei a notícia do acontecimento com essa foto... puxa vida...



Sabe, a Volvo tem uma visão incrível das coisas e ela sempre teve essa visão. Além de construir sua história de forma exemplar, ainda temos o registro de muitos dos detalhes. Isso é maravilhoso!

Aproveito até para agradecer ao jornal Diário do Paraná que pelo jeito tinha uma equipe somente para cobrir a Volvo. Que bom!



Diário do Paraná 29.4.1977

E mais papel sendo assinado para formalizar de vez o compromisso da Volvo com o Brasil.



Diário do Paraná 29.4.1977

Este jornal é muito interessante.

O deputado Luiz Alberto de Oliveira em discurso na Assembleia Legislativa ressaltou que o projeto da Volvo não conta com favores fiscais ou equivalentes do Governo do Paraná e não haverá gastos ou pagamentos com royalties, patentes ou assistência técnica enquadrando-se perfeitamente nas diretrizes da política de desenvolvimento do Governo Federal, pois em síntese atende aos seguintes objetivos:

 

Forte conteúdo social;

Adaptação e criação de tecnologia;

Abertura de novos campos de exportação de manufaturados;

Desconcentração industrial;

Fortalecimento de novo polo de desenvolvimento;

Atenuação dos desníveis regionais de desenvolvimento industrial;

Economia de combustíveis líquidos;

Aumento da receita tributária direta federal e estatual.

 

Foi um trabalho muito bem estudado e conduzido. A implantação da Volvo em Curitiba era um negociação ganha-ganha e totalmente transparente. 



Jornal do Comércio 30.4.1977

A Suécia estava com tudo! Totalmente interessada em investir no Brasil. A instalação da Volvo era mais um grande avanço nessa boa relação entre os dois países.


Diário do Paraná 3.5.1977

O serviço de terraplanagem do terreno da Volvo está marcado para agosto.


Diário do Paraná 5.5.1977

Mais uma grande imagem do dia 27/4/77 na ocasião do lançamento da pedra fundamental da fábrica da Volvo em Curitiba


Diário do Paraná 7.5.1977

Opa, que notícia! Fusão entre Volvo e Scania... vejamos como isso se desenrola.


Diário do Paraná 29.5.1977

E o assunto da fusão entre as montadoras já foi motivo para dizerem que a Volvo iria embora de Curitiba... eita povo que gosta de inventar conversa... após todas as negociações, sair de lá seria totalmente inviável...


Diário do Paraná 5.6.1977

Mais um diretor da Volvo chega à Curitiba para inspecionar as obras. Karl Keifl também vai desmentir os boatos de transferência das instalações...

 


Jornal do Brasil 22.7.1977

Seguindo a mesma linha da Mercedes-Benz, a Fiat também criticou a chegada da Volvo ao Brasil. Disse que o mercado de caminhões pesados está bem servido pelos atuais fabricantes, Scania Vabis, Mercedes-Benz e a Fiat-Diesel (sucessora da FNM). Ainda completou: “Não há dúvida de que a Volvo produz caminhões excelentes. O problema é que o Brasil já está bem servido por produtos excelentes”.

Vejo total falta de coerência... Isso aí é medo de perder os clientes. Essa explicação não justifica nada.


Diário do Paraná 4.9.1977

E a obra continua...



Jornal do Comércio 21.9.1977

A fusão entre Volvo e Scania não aconteceu. O motivo foi o atraso da Scania em aceitar a proposta da Volvo.

A Volvo lamentou que a negociação não se concretizou.

 

 

Vou encerrar esta parte por aqui.

Abrangemos o período de 20 meses onde pudemos ver com mais detalhes a negociação e estudos feitos para que a Volvo chegasse ao Brasil. Passamos também pelo lançamento da pedra fundamental da fábrica onde tivemos a participação do Príncipe Bertil. Surgiram alguns boatos e notícias que não se concretizaram, mas nada disso influenciou no objetivo principal de instalar a Volvo em Curitiba-PR. Chegamos a etapa de saber mais sobre a obra de construção dos prédios e veremos tudo isso mais de perto na próxima parte desta pesquisa.

  

Resumo dos acontecimentos:

12/1975 - O prefeito de Curitiba, Saul Raiz apresenta ao presidente a proposta de instalação da Volvo em sua cidade.

27/10/76 - O governador de Curitiba, Jayme Canet Junior recebe a notícia do presidente do Brasil, Ernesto Geisel que a instalação da Volvo está aprovada.

14/4/77 - Aniversário de 50 anos da Volvo.

24/4/77 - O Príncipe sueco Bertil chega ao Brasil para tratar assuntos em Brasília e para o lançamento da fábrica da Volvo.

27/4/77 - O lançamento da pedra fundamental da fábrica da Volvo em Curitiba.

9/1977 - Início das obras no terreno.



Um grande abraço aos amigos que fiz na Volvo. Demorou, mas a pesquisa saiu heim rsrsr

Obrigado pela leitura. Em breve voltarei com a segunda parte.

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